Pesticida que mata abelhas
Um dos pesticidas mais utilizados na agricultura e suspeito de estar a matar abelhas pode afectar também o sistema nervoso humano e deve ser alvo de controlo e limites mais rígidos. O alerta é da Agência Europeia de Segurança Alimentar (AESA), num parecer divulgado esta terça-feira.

Os pesticidas em causa são da família dos neonicotinóides - insecticidas que têm sido acusados de estarem a dizimar populações de abelhas. Alguns estão sob uma proibição temporária na União Europeia, imposta por Bruxelas desde o princípio deste mês.

O parecer da AESA resulta de um pedido da Comissão Europeia, feito em Novembro de 2012, depois de um novo estudo ter sugerido riscos daqueles pesticidas para o ser humano. Realizado por investigadores do Instituto de Ciências Médicas de Tóquio e publicado na revista científica PLOS One, o estudo avaliou o efeito dos insecticidas acetamiprida e imidaclopride em células nervosas de ratos. A conclusão foi a de que ambos podem afectar o desenvolvimento do cérebro, tal como a nicotina.

À luz dos novos dados, a AESA reavaliou toda a produção científica existente e, embora haja muitas incertezas, chegou à mesma conclusão. “Ambos os compostos podem afectar o desenvolvimento e a funcionalidade dos neurónios”, sustenta a agência, no seu parecer, referindo-se às células que são a base do sistema nervoso.

A AESA chama a atenção para uma série de limitações metodológicas dos estudos existentes, dizendo que ainda é necessário mais investigação com animais. Mas ainda assim a agência recomenda uma redução, nalguns casos substancial, das doses aceitáveis de exposição aos pesticidas.

Para a acetamiprida, a dose de ingestão diária – que significa o limite considerado seguro que pode ser consumido através da água ou dos alimentos – deveria ser reduzida para um terço da actual. Para o imidaclopride, o limite actual é considerado adequado, mas a dose de referência aguda – o valor máximo a ingerir num único dia – deveria cair em 25%.

Mais, a AESA também recomenda que todos os processos de autorização de novos pesticidas da classe dos neonicotinóides sejam precedidos de estudos para avaliar a sua potencial toxicidade na fase de desenvolvimento do sistema nervoso – ou seja, nos fetos e nas crianças.

O parecer da AESA é um novo sinal de alerta não só em relação aos pesticidas, mas também à forma como estão a ser aprovados. Os neonicotinóides surgiram no mercado na década de 1990. Em Portugal, a primeira variedade comercial foi autorizada em 1997.

Desenvolvidos a partir da molécula da nicotina, foram rapidamente adoptados por serem ao mesmo tempo eficientes como insecticidas e menos tóxicos para o ser humano e outros animais do que outras gamas de pesticidas criadas no passado. O imidaclopride é actualmente o insecticida mais utilizado mundialmente na agricultura.

Ao mesmo tempo em que granjeavam sucesso, os neonicotinóides transformaram-se em alvo de suspeita. Vários estudos sugerem que os pesticidas estejam associados ao desaparecimento das abelhas das colmeias – um fenómeno que se observa em vários países europeus e nos Estados Unidos. Uma das hipóteses é a de que, uma vez absorvidos através do néctar e do pólen, os neonicotinóides prejudicam a capacidade de navegação das abelhas.

Em Janeiro passado, a AESA já tinha sugerido que tais pesticidas só deveriam ser utilizados em culturas onde as abelhas não se alimentam. Quatro meses mais tarde, a Comissão Europeia decidiu proibir três pesticidas – imidaclopride, tiametoxam e clotianidina – para determinados usos, durante dois anos a partir de Dezembro.

As multinacionais Bayer e Syngenta – fabricantes de insecticidas neonicotinóides – estão a tentar bloquear legalmente a moratória. Em processos separados junto do Tribunal Europeu de Justiça, ambos os grupos contestam a decisão da Comissão Europeia, dizendo que os pesticidas não prejudicam as abelhas e criticando a avaliação da AESA.

Os fabricantes também dizem que a decisão foi tomada sem o apoio unânime dos Estados-membros da UE. Na votação, em Abril de 2013, 15 países posicionaram-se a favor da moratória, oito contra – incluindo Portugal – e quatro abstiveram-se. Sem uma maioria qualificada, a decisão ficou a cargo da Comissão, que avançou com a proibição.

A nova opinião agora expressa pela AESA promete aquecer o conflito entre Bruxelas e a indústria de pesticidas. A Comissão vai enviar agora a opinião da AESA para os fabricantes, aguardando os seus comentários. A redução dos limites aceitáveis de exposição aos pesticidas será possivelmente avaliada em Março.

Fonte PÚBLICO 17-12-2013

 

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