A Fundação Gulbenkian e o PÚBLICO iniciam nesta sexta-feira um ciclo de conferências sobre o futuro da alimentação, para pensar nas mudanças na agricultura e nas nossas dietas. Como produzir mais e desperdiçar menos?
Um mundo em que cada vez mais gente come carne, uma pressão crescente sobre os cereais que alimentam os animais, solos a ficarem esgotados, seca, recursos hídricos a serem explorados até ao limite e, ao mesmo tempo, desperdícios de alimentos na ordem dos 30% a 50%. Como vamos conseguir, no futuro, alimentar a população mundial?
A pergunta é o ponto de partida para um ciclo de conferências organizadas pela Fundação Calouste Gulbenkian/PÚBLICO, intitulado O Futuro da Alimentação - Ambiente, Saúde e Economia. A primeira, Enquadramento Global da Produção e do Consumo de Alimentos, com o especialista britânico Charles Godfray, professor da Universidade de Oxford, acontece hoje, às 17h30, na fundação, em Lisboa, e a entrada é livre.
As subidas dos preços dos alimentos a que assistimos em 2008 e 2009 tornaram ainda mais premente este debate. "A questão da qual partimos tem que ver precisamente com a nossa capacidade para alimentar um mundo com nove ou dez mil milhões de pessoas", explica José Lima Santos, que coordenou o ciclo de conferências. "Isto prende-se com alterações climáticas, mas também com mudanças nas dietas alimentares. No Brasil, na China, na Índia, as pessoas estão a mudar a alimentação, a consumir mais carne, o que causa uma pressão muito maior sobre a procura de cereais."
"Vai ser necessário produzir muitos mais alimentos até 2030", o ano em que, segundo o especialista britânico John Beddington, vamos assistir a uma "tempestade perfeita" devido à escassez de água, energia e alimentos. O problema, prossegue Lima Santos, é que "a produtividade dos cereais por hectare está a aumentar de forma cada vez mais lenta".
A este cenário soma-se a questão do preço do petróleo, "muito importante para a produção de alimentos", e a falta de água. "Temos na África Subsariana, mas sobretudo no Norte da Índia e na China, zonas altamente povoadas em que os níveis de esgotamento dos recursos hídricos são brutais e os aquíferos estão a ser perfurados em níveis impensáveis", alerta o professor do Instituto Superior de Agronomia.
É preciso, portanto, pensar no assunto e procurar soluções. E estas passam por onde? "Até agora", diz Lima Santos, "os aumentos de produção agrícola dependeram integralmente ou do aumento do uso de água e energia para fabricar adubos ou pesticidas ou da expansão de terra cultivada".
A dependência nacional
A partir daqui, as soluções têm de ser diferentes. Algumas passam pela tecnologia e, aí, a tendência será para investir menos na planta geneticamente modificada, super-resistente, e mais na "optimização do funcionamento dos ecossistemas", recuperando "muitas ideias dos sistemas tradicionais de agricultura" mas "utilizando mais intensivamente a ciência".
"Outro dos ajustamentos que temos de fazer é ao nível das dietas." Mas não é simples, porque "a nossa alimentação não é meramente biológica, é cultural" - daí que uma das conferências deste ciclo seja sobre "cultura e ética". "Há um compromisso ético sem o qual estas questões não se resolvem." E aí entra a questão do desperdício - em relação à qual vai ser apresentado na conferência de Dezembro um estudo realizado em Portugal.
A situação de Portugal vai, aliás, estar presente em todo o ciclo. "O problema é global, mas queremos também perceber as implicações que tem para Portugal", um país que "raramente, se é que alguma vez, foi auto-suficiente em alimentação". Portugal importa grande parte do que consome. "Temos cerca de 30% de dependência do exterior, mas o facto é que nunca fomos auto-suficientes, excepto em dois anos da campanha do trigo, na altura do Estado Novo, mas isso foi feito à custa de uma degradação enorme dos solos, o que era insustentável." Para começar a pensar o assunto, a conferência de hoje inclui também uma intervenção de Arlindo Cunha, ex-ministro da Agricultura, sobre a Política Agrícola Comum e a globalização.
Conferências até Dezembro
O objectivo da Fundação Gulbenkian/PÚBLICO ao organizar uma série de conferências sobre alimentação é "antecipar um dos problemas que mais profundamente marcarão a nossa sociedade" no futuro. O ciclo que hoje se inicia terá outras seis conferências até ao final do ano. A seguinte, a 11 de Abril, tem como tema Alimentação e Saúde e inclui um workshop sobre Alimentação em Tempo de Crise.
A 17 de Maio, o tema será Alimentação e Desenvolvimento e, em Junho (dia 14), Alimentação e Economia (com workshop sobre casos de sucesso na área alimentar).
Depois de uma interrupção, o ciclo regressa em Outubro (dia 16) com uma conferência sobre Alimentação, Ambiente e Pescas; em Novembro (dia 2) com Alimentação, Agricultura e Ambiente. E termina em Dezembro (dia 13) com um debate sobre Alimentação, Cultura e Ética, que inclui um workshop com a apresentação de um estudo sobre desperdício alimentar em Portugal.
Fonte Publico 09-03-2012
A pergunta é o ponto de partida para um ciclo de conferências organizadas pela Fundação Calouste Gulbenkian/PÚBLICO, intitulado O Futuro da Alimentação - Ambiente, Saúde e Economia. A primeira, Enquadramento Global da Produção e do Consumo de Alimentos, com o especialista britânico Charles Godfray, professor da Universidade de Oxford, acontece hoje, às 17h30, na fundação, em Lisboa, e a entrada é livre.
As subidas dos preços dos alimentos a que assistimos em 2008 e 2009 tornaram ainda mais premente este debate. "A questão da qual partimos tem que ver precisamente com a nossa capacidade para alimentar um mundo com nove ou dez mil milhões de pessoas", explica José Lima Santos, que coordenou o ciclo de conferências. "Isto prende-se com alterações climáticas, mas também com mudanças nas dietas alimentares. No Brasil, na China, na Índia, as pessoas estão a mudar a alimentação, a consumir mais carne, o que causa uma pressão muito maior sobre a procura de cereais."
"Vai ser necessário produzir muitos mais alimentos até 2030", o ano em que, segundo o especialista britânico John Beddington, vamos assistir a uma "tempestade perfeita" devido à escassez de água, energia e alimentos. O problema, prossegue Lima Santos, é que "a produtividade dos cereais por hectare está a aumentar de forma cada vez mais lenta".
A este cenário soma-se a questão do preço do petróleo, "muito importante para a produção de alimentos", e a falta de água. "Temos na África Subsariana, mas sobretudo no Norte da Índia e na China, zonas altamente povoadas em que os níveis de esgotamento dos recursos hídricos são brutais e os aquíferos estão a ser perfurados em níveis impensáveis", alerta o professor do Instituto Superior de Agronomia.
É preciso, portanto, pensar no assunto e procurar soluções. E estas passam por onde? "Até agora", diz Lima Santos, "os aumentos de produção agrícola dependeram integralmente ou do aumento do uso de água e energia para fabricar adubos ou pesticidas ou da expansão de terra cultivada".
A dependência nacional
A partir daqui, as soluções têm de ser diferentes. Algumas passam pela tecnologia e, aí, a tendência será para investir menos na planta geneticamente modificada, super-resistente, e mais na "optimização do funcionamento dos ecossistemas", recuperando "muitas ideias dos sistemas tradicionais de agricultura" mas "utilizando mais intensivamente a ciência".
"Outro dos ajustamentos que temos de fazer é ao nível das dietas." Mas não é simples, porque "a nossa alimentação não é meramente biológica, é cultural" - daí que uma das conferências deste ciclo seja sobre "cultura e ética". "Há um compromisso ético sem o qual estas questões não se resolvem." E aí entra a questão do desperdício - em relação à qual vai ser apresentado na conferência de Dezembro um estudo realizado em Portugal.
A situação de Portugal vai, aliás, estar presente em todo o ciclo. "O problema é global, mas queremos também perceber as implicações que tem para Portugal", um país que "raramente, se é que alguma vez, foi auto-suficiente em alimentação". Portugal importa grande parte do que consome. "Temos cerca de 30% de dependência do exterior, mas o facto é que nunca fomos auto-suficientes, excepto em dois anos da campanha do trigo, na altura do Estado Novo, mas isso foi feito à custa de uma degradação enorme dos solos, o que era insustentável." Para começar a pensar o assunto, a conferência de hoje inclui também uma intervenção de Arlindo Cunha, ex-ministro da Agricultura, sobre a Política Agrícola Comum e a globalização.
Conferências até Dezembro
O objectivo da Fundação Gulbenkian/PÚBLICO ao organizar uma série de conferências sobre alimentação é "antecipar um dos problemas que mais profundamente marcarão a nossa sociedade" no futuro. O ciclo que hoje se inicia terá outras seis conferências até ao final do ano. A seguinte, a 11 de Abril, tem como tema Alimentação e Saúde e inclui um workshop sobre Alimentação em Tempo de Crise.
A 17 de Maio, o tema será Alimentação e Desenvolvimento e, em Junho (dia 14), Alimentação e Economia (com workshop sobre casos de sucesso na área alimentar).
Depois de uma interrupção, o ciclo regressa em Outubro (dia 16) com uma conferência sobre Alimentação, Ambiente e Pescas; em Novembro (dia 2) com Alimentação, Agricultura e Ambiente. E termina em Dezembro (dia 13) com um debate sobre Alimentação, Cultura e Ética, que inclui um workshop com a apresentação de um estudo sobre desperdício alimentar em Portugal.
Fonte Publico 09-03-2012
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