plástico na comida
A pergunta refere-se ao plástico mesmo, das caixas, copos e garrafas, e não ao “fast food”. E a resposta é, muito provavelmente, sim. É difícil impedi-lo totalmente, mas podemos minimizar os riscos.

Todos os dias comemos, bebemos e respiramos contaminantes do ambiente. É praticamente impossível conseguirmos escapar a esses poluentes, mas podemos evitar a exposição em algumas situações, nomeadamente em relação àquilo que comemos. Pelo menos, essa é a proposta da equipa do grupo Cintesis da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP). O alerta foi deixado no Congresso de Nutrição e Alimentação, que decorreu no Porto.

Prefira beber o café numa chávena em vez de um copo de plástico – não só é mais amigo do ambiente, como da sua saúde –, evite aquecer a comida em caixas de plástico – escolha taças de vidro ou pratos de cerâmica – e não guarde alimentos ainda quentes nessas caixas de plásticos. O calor dos alimentos ou as vibrações do micro-ondas fazem com que alguns dos componentes do plástico sejam libertados na comida.

Não há razão para alarme, reforçou Diogo Pestana, investigador do Departamento de Bioquímica da FMUP, durante a conversa com o Observador, mas sempre que puder evitar, melhor. A quantidade de moléculas que podem passar do plástico para os alimentos é, à partida, pequena, portanto não provoca um caso de toxicidade aguda (rápida). Mas se estivermos expostos a estas moléculas todos os dias, pode haver acumulação no nosso corpo e a longo prazo um efeito no funcionamento do organismo, como a desregulação do sistema hormonal e o aparecimento de doenças metabólicas.

É quase impossível escapar aos contaminantes”, disse Diogo Pestana. “Hoje em dia, é impossível estar completamente fora dos espetro destes compostos. Quem fala dos plásticos fala dos outros contaminantes, como metais pesados, dioxinas [resultantes da incineração a altas temperaturas] ou aminas heterocíclicas [resultante de alguns processos de confeção dos alimentos].”


O bisfenol A e os ftalatos – um grupo de compostos usado para que o plástico seja mais maleável – são normalmente eliminados pelo organismo, disse Diogo Pestana, o problema é a exposição crónica (constante). Mas existem outros componentes que motivam preocupações acrescidas, como os pesticidas ou as algumas dioxinas – chamados de poluentes orgânicos persistentes –, que são de difícil degradação e se podem acumular na gordura dos animais que comemos ou na nossa. Mas como não podemos deixar de comer, é importante encontrar um equilíbrio entre a importância de ingerirmos certos alimentos e o risco de exposição aos contaminantes.

Bisfenol A

Em 2011, a Comissão Europeia baniu o uso de bisfenol A em biberões, pelo risco de haver contaminação das crianças e porque estas, até aos seis meses, não têm capacidade para eliminar o composto do organismo.

Em 2015, a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar compilou os estudos existentes sobre o contacto com o bisfenol A e a sua ingestão. A EFSA concluiu que, embora o composto possa causar problemas renais e de fígado e tivessem sido detetados problemas no desenvolvimento de glândulas mamárias de ratos, a exposição dos humanos em contexto normal é tão baixa que não constitui risco para a saúde.

Alguns recipientes indicam não conter bisfenol A ou ftalatos ou até ser adequados para ir ao micro-ondas, mas Diogo Pestana afirmou que nestes casos podem existir outros compostos que não são tão conhecidos e cujo efeito não está estudado. Acima de tudo, o cientista defendeu que deve ser feita mais investigação e que as pessoas devem estar melhor informadas. Mas o objetivo não é que a população fique em pânico e que deixem de comer tudo. Até porque o stress também pode ser um desregulador da função hormonal.

Certos contaminantes ligam-se bem com os lípidos (uma das moléculas que constitui a gordura) e são acumulados no nosso tecido adiposo. Mas este tecido não se resume a um armazém inerte de gordura. É, na verdade, um órgão bastante ativo e com muita importância na regulação hormonal. Os contaminantes acumulados podem interferir na função do tecido e, consequentemente, na produção de hormonas.

O tecido adiposo é, a seguir aos ovários, uma das principais fontes de estrogénio [hormona feminina que regula o ciclo menstrual]”, disse ao Observador Diana Teixeira, nutricionista e colega de Diogo Pestana no grupo Cintesis. “Se temos no tecido adiposo compostos que modificam a síntese de estrogénios, estamos também a modificar a quantidade de estrogénios que são sintetizados no tecido adiposo.”


As intervenções na massa gorda, como a perda de peso, pode fazer com que os contaminantes fiquem em circulação e se acumulem noutras áreas deste tecido ou noutros órgãos que também tenham gordura. Um dos grupos onde esta redistribuição dos contaminantes pode acontecer é o dos doentes sujeitos a cirurgia bariátrica (para redução do volume do estômago ou limitação da capacidade de absorção, que levem à perda de peso). Diogo Pestana, que estuda estes doentes, frisou que isto não significa que os doentes não devam fazer a cirurgia, que é muitas vezes essencial à melhoria da qualidade de vida, mas reforçou que o assunto deve ser estudado.

Diana Teixeira escolheu estudar apenas as mulheres sujeitas à cirurgia e o efeito nas doenças cardiovasculares. A investigadora verificou que as melhores em idade fértil (período pré-menopausa) apresentavam um risco maior de doença cardiovascular causado pela ação adversa dos contaminantes sobre a produção de estrogénios. Nas mulheres em idade pós-menopausa, como existem outros fatores de risco para a doença, não foi possível encontrar um efeito estatisticamente significativo dos contaminantes.

A acumulação de contaminantes na gordura, no caso das mulheres, pode afetar o próprio metabolismo, com as doenças cardiovasculares, hipertensão, diabetes ou obesidade, mas também pode afetar as vidas que geram. O tecido adiposo além de influenciar a produção de hormonas durante a gestação e aleitamento, também é recrutado com reserva para contribuir para o desenvolvimento do feto e para a produção de leite. A presença de contaminantes na gordura que interfiram no desenvolvimento do embrião, podem condicionar o aparecimento de doença metabólica, na fase adulta ou da infância, do ser que está a ser gerado, referiram os investigadores.

Claro que isto não quer dizer que as mães não devem amamentar, reforçou Diogo Pestana. A ausência de leite materno no desenvolvimento de um bebé teria consequências mais graves do que uma possível contaminação com os poluentes que a mãe possa ter acumulado no organismo. Da mesma forma que não devemos deixar de comer salmão, que tem nutrientes essenciais para uma alimentação saudável. Prevenção é a palavra de ordem e as recomendações podem ser encontradas no site Nutrimento da Direção-Geral de Saúde aqui e aqui).

Fonte: Observador 25-05-2016

 

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