Transgénicos na Europa com solo fértil para polémica
Aprovar uma batata modificada foi decisão incluída na primeira reunião da Comissão Europeia com o seu novo elenco de comissários, entre os quais já não se contava Stavros Dimas, grande opositor aos OGM (Organismos Geneticamente Modificados).



Batata modificada teve o "sim" da Comissão mas renovam-se vozes críticas sobre riscos.

Terá sido uma vitória política de Durão Barroso, que no seu primeiro mandato viu travados os seus esforços para semear na Europa uma maior abertura ao cultivo de plantas com características modificadas em laboratório para melhor resistirem a pragas ou à aplicação de herbicidas. Renasceu a polémica sobre o cultivo de transgénicos, porque nenhum campo arreda pé.

De um lado, os defensores dos transgénicos, que alegam ser perfeitamente seguro o seu cultivo e uso, reclamando vantagens de produtividade. Do outro lado, os que vêem riscos e até inutilidade deste recurso. Neste campo, distinguem-se os que recusam liminarmente os transgénicos e aqueles que invocam o princípio de precaução (aliás a regra que tem vigorado na União Europeia), pedindo mais estudos e tempo de observação.

Temores e dúvidas

Questões de alegada insegurança para a saúde humana têm entrado na argumentação, que também coloca dúvidas sobre os efeitos dos transgénicos no meio ambiente: estará em causa a biodiversidade porque serão afectados insectos, plantas e toda a cadeia natural nas zonas onde se cultive OGM. Por outro lado, haverá da parte das grandes empresas produtoras das novas sementes uma estratégia para erradicar as espécies tradicionais, deixando os agricultores dependentes de variedades que têm em cima do custo do produto ainda os direitos de patente. O negócio é de dimensão: só com a nova batata modificada que a Comissão Europeia autorizou, a empresa criadora da variedade espera ter um lucro de 30 a 40 milhões de euros por ano.

Criados para resistir

Peras Zen A soja e o milho são actualmente as culturas transgénicas mais espalhadas pelo mundo. Mas também há significativas extensões de cultivo OGM na colza, beterraba e algodão. Estas variedades foram desenhadas para tolerar herbicidas (podendo estes, assim, ser usados só para destruir ervas) ou para serem resistentes a insectos (evitando pragas destruidoras). Além destas culturas há também cultivo de tomate modificado para melhor resistir ao transporte sem apodrecer. Agora, a batata autorizada para a Europa não se destina a consumo humano; o seu amido foi concebido para ter melhor resistência e consistência e servirá para a indústria do papel. Outro uso tem por destino as rações animais, o que põe ainda mais desconfiados os anti-OGM. As empresas de biotecnologia prometem avançar com pedidos de autorização para outra batata transgénica, essa capaz de ser frita sem absorver tanta gordura como as tradicionais. Em Portugal, no ano passado, o milho transgénico ocupou cerca de cinco mil hectares, a maior parte no Alentejo e no Vale do Mondego. Além destes cultivos, há áreas afectas a demonstrações para os agricultores se convencerem (ou não) de anunciadas vantagens. Recorde-se que, num Verão recente, o país viu as imagens de destruição de um campo de milho transgénico, no Algarve, feita por um grupo de activistas, na sua grande parte provenientes de outros países.

Posições inconciliáveis

A Confederação Nacional de Agricultura (CNA), a propósito da recente aprovação por Bruxelas da batata transgénica e de novas variedades de milho, já apelou ao Governo para que não as autorize em território nacional (esse é um direito dos parceiros e a maioria dos 27 utiliza-o). Argumenta a CNA que "o país não tem qualquer interesse estratégico em tais produções" e reclama o recurso ao princípio de precaução, bem como maior consonância com as posições de movimentos e cidadãos.

As plantas OGM receberam genes de outros seres vivos, por exemplo de uma bactéria, ganhando deles características que não estariam expressas no seu genoma original. O que faz, então, levantar a celeuma? Para Margarida Silva, bióloga e coordenadora da Plataforma Transgénicos Fora, "faltam estudos de longo prazo sobre os efeitos na saúde humana e no ambiente". Por outro lado, acrescenta, "é a indústria que apresenta os estudos e as instâncias políticas reguladoras não fazem verificação nem pedem estudos independentes às universidades".

Segundo Margarida Silva, "sobre alguns transgénicos que já estão no mercado, quando são feitos estudos por grupos de investigação independentes verifica-se que há impactos negativos para a saúde e para o ambiente". E especifica: "Comer um alimento transgénico e um que o não seja não é a mesma coisa, já foram referidos efeitos na função hepática e renal, sabendo-se também que em termos ambientais há impacto em espécies" alheias ao alvo traçado pela modificação genética. Resumindo: "Não há transgénico que responda à segurança".

No pólo oposto desta posição está outro biólogo, Pedro Fevereiro, que assume a defesa dos transgénicos postos no mercado e outros que a tecnologia desenvolva. "As variedades aprovadas não têm risco superior às variedades convencionais", afiança, atribuindo aos opositores "o medo da novidade, a convicção religiosa de não interferir no genoma dos organismos e a defesa de interesses económicos, como os da França, que tem grandes produções de milho armazenadas e não quer concorrência dos lotes mais baratos dos EUA e Argentina". Ainda na opinião de Pedro Fevereiro, o facto de os estudos de segurança serem os das empresas "é natural, porque são elas que vão vender o produto, tal como acontece com outros no mercado."

Fonte JN 07-03-2010

 

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